Minha jornada pessoal
Meu nome é Eloise, mas quase todo mundo me chama de Elo ou Elozinha. Tenho 19 anos, sou estudante de nutrição, criadora de conteúdo vegano e atleta de corrida de alto rendimento. Mas nem sempre minha relação com a alimentação foi leve, equilibrada e cheia de propósito como é hoje.
Durante muitos anos, vivi uma batalha silenciosa, uma guerra entre minha mente, meu corpo e o espelho. Essa guerra se chamava anorexia nervosa, um transtorno que me fez perder não só peso, mas também momentos especiais com quem eu amo e partes de mim mesma. Hoje, olhando pra trás, entendo que o veganismo foi uma das chaves que me ajudou a reconstruir minha liberdade, minha relação com a comida, fé na vida e meu amor por mim mesma.
O começo: quando o espelho se tornou um inimigo
Desde muito nova, eu cresci em um mundo que colocava o corpo feminino como medida de valor. Na escola, eu me comparava com as meninas da minha turma e desejava ter o corpo “perfeito” das modelos e influenciadoras que via nas redes. Essas comparações começaram pequenas, mas se tornaram um sussurro constante no meu inconsciente: “você precisa emagrecer”.
Aos poucos, comecei a restringir alimentos, a evitar lanches com amigos e a fazer exercícios escondida, achando que estava apenas sendo “disciplinada”. Na verdade, eu estava sendo consumida pelo medo de engordar.
Quando meus pais e parentes perceberam, eu já estava muito magra. Lembro das perguntas na praia, das olhadas preocupadas, e de como, mesmo assim, eu não conseguia enxergar o que os outros viam. No espelho, eu nunca estava “magra o suficiente”.
O que é, afinal, a anorexia nervosa?
A anorexia nervosa é um transtorno alimentar grave, caracterizado por uma distorção da imagem corporal, restrição intensa de alimentos e medo extremo de ganhar peso.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), é um dos transtornos psiquiátricos com maior taxa de mortalidade. E de acordo com dados da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), o número de diagnósticos de transtornos alimentares entre adolescentes e jovens adultos aumentou em mais de 300% na última década.
Mas o que muitas pessoas não entendem é que a anorexia não é vaidade. Ela é uma dor silenciosa, uma tentativa de buscar controle em um mundo que parece fora de controle. É uma forma de gritar “eu existo”, mesmo que através do silêncio do corpo.
O pedido de ajuda e o começo da recuperação
Em 2019, quando a situação chegou ao limite, finalmente pedi ajuda. Meus pais me levaram a uma psicóloga, que prontamente me atendeu, e em seguida fui encaminhada a uma psiquiatra. Recebi o diagnóstico: anorexia nervosa.
Começou então uma verdadeira força-tarefa de recuperação: psicóloga, psiquiatra, nutricionista e endocrinologista. Foi um processo longo, de muitos altos e baixos. Com o tempo, minha psicóloga sugeriu que eu compartilhasse minha história nas redes sociais, como forma de transformar dor em propósito. Foi assim que nasceu o meu perfil @elo.veg.
Como conheci o veganismo
Durante minha recuperação, eu ainda tinha uma relação delicada com a comida. Comecei a buscar receitas “saudáveis” na internet, mas uma delas me chamou atenção: “receita vegana”.
Eu já tinha ouvido falar sobre o veganismo, mas de forma superficial. Achava que era algo “muito difícil”, quase impossível pra mim, ainda mais porque meus pais sempre foram muito de churrasco e acreditava que seria muito desafiador convencer eles. Mas aquela curiosidade plantou uma semente.
Comecei a ver mais conteúdos sobre o tema nas redes, e um dia assisti ao documentário Cowspiracy. Ele abriu completamente meus olhos. Percebi o impacto da exploração animal no planeta e entendi que o veganismo não era sobre restrição, e sim sobre libertação, minha e dos animais.
Depois disso, simplesmente não consegui mais consumir alimentos de origem animal. Foi um processo de consciência profunda, e também de conversas em casa, precisei mostrar aos meus pais que aquilo não era “mais uma dieta”, e que meu foco principal ainda era me recuperar totalmente da anorexia.
Fizemos um trato: eu seguiria o veganismo, desde que continuasse cuidando da minha saúde e acompanhamento médico. E foi assim que, aos poucos, minha relação com a comida começou a se curar.
Do controle à compaixão
Antes, comer era culpa. Agora, passou a ser um ato de compaixão. O veganismo me ensinou que alimentar o corpo também é alimentar o coração e que para lutar pelos animais, eu precisava estar viva, presente, nutrida. Entendi que “nutrir” é diferente de “controlar”. Passei a escolher os alimentos não pelo número de calorias, mas pelo significado ético e afetivo que eles carregam.
E como disse Leslie Cross, vice-presidente da Vegan Society em 1951, o veganismo é “a doutrina de que o homem deve viver sem explorar animais” . Essa visão transformou completamente a forma como vejo a vida porque não é apenas sobre o que vai no prato, mas sobre como enxergamos os animais.
E coloquei aquilo na minha cabeça, era o que me movia todos os dias, mesmo os mais difíceis, porque queria mostrar para as pessoas que era possível sim ser saudável, ganhar massa muscular sendo vegana, e a causa animal me deu forças para lutar contra esse transtorno.
O papel do esporte nessa história
O esporte também foi uma das minhas maiores terapias. Comecei jogando vôlei, depois entrei na musculação, e hoje me dedico ao atletismo e corrida de alto rendimento. Correr me ensinou algo que a anorexia tinha me tirado: a sensação de liberdade. No esporte, encontrei propósito, energia e autoestima. Entendi que meu corpo não é um inimigo, ele é o instrumento que me permite viver, me expressar e lutar por aquilo em que acredito.
Hoje, cada treino é um lembrete de que a força não vem da magreza, mas da vitalidade. E é com orgulho que mostro ao mundo que é possível ser uma atleta vegana de alta performance, sem explorar nenhum animal.
O veganismo como caminho de transformação
O veganismo não foi uma “cura milagrosa”. A recuperação da anorexia veio do conjunto: da terapia, da nutrição, da minha família e desse novo olhar compassivo que aprendi a ter com o mundo e comigo. Mas ele foi o fio que costurou toda essa transformação, me mostrando que é possível viver de forma ética, saudável e feliz. Hoje, quando olho para minha trajetória, percebo que minha história não é sobre dor é sobre renascimento.
Acredito que transtornos alimentares não tem cura, mas sim um controle, hoje sei identificar muitos pensamentos sabotadores, já tive muitos altos e baixos e recaídas em minha jornada. Mas nunca desisti porque o veganismo me motiva a continuar lutando todos os dias, porque sei que sou a voz de muitos que não tem.
Um recado pra você
Se você está enfrentando algo parecido, quero que saiba: você não está só. A recuperação é possível, mesmo quando parece impossível. Procure ajuda, abrace o processo e lembre-se: a sua vida vale infinitamente mais do que qualquer número na balança. Hoje, cada refeição que faço é um lembrete: não se trata de contar calorias, mas de contar histórias de amor: por mim, pelos animais e pelo planeta.

Eloise Beraldo é estudante de Nutrição, criadora de conteúdo e atleta de corrida de alto rendimento. Como ativista vegana, acredita que o verdadeiro desempenho (no esporte e na vida) nasce do equilíbrio entre corpo, mente e compaixão. Sua relação com a alimentação é marcada por uma jornada de superação: após enfrentar a anorexia, encontrou no veganismo não apenas uma forma de se nutrir, mas de se reconectar com a própria existência. Hoje, usa sua voz e sua vivência para mostrar que é possível alcançar saúde, força e propósito sem explorar nenhum animal.


